abril 10, 2007

Centros de Cultura

Sempre é prudente refletir sobre o que é cultura. Cultura, segundo o dicionário pode ser: “1. Ato, efeito ou modo de cultivar. 2. O complexo dos padrões de comportamentos, das crenças, das instituições e doutros valores transmitidos coletivamente, e típicos de uma sociedade; civilização.” (Dicionário Aurélio, 1977.). Logo, um centro cultural pode ser de inúmeros aspectos diferentes, desde uma biblioteca à um museu, de uma pinacoteca à uma sala de espetáculos, de zoológico ao jardim botânico, passando até por sala de aula, escola, por que não? O que não passa é por cinema, circo, campo de futebol, autódromo, hipódromo, certos tipos de teatro, shows e parques.

Pode-se dizer que certos filmes são verdadeiras obras culturais, pois refletem os aspectos de sociedades, porém o cinema não é só isso. Na maioria das vezes é uma diversão, entretenimento. Tanto o é que quase sempre os ardidos cinéfilos os dividem em filme de autor e produção comercial. A divisão é tão sutil e tão pessoal que tudo parece uma bagunça. Um exemplo é como categorizar o José Mojica Marins. Um autor de filmes trash, ou uma pérola do terror nacional mal compreendida e com pouco recurso? Sempre vejo os cinéfilos fugindo ao tema.

Circo? Tenho horror a circo. Da minha infância fui muito pouco e estes poucos que fui já não existem mais, como o Garcia. Já não achava nenhuma graça em ver uma menina sendo pendurada pelo cabelo, os tigres, os leões, “globo da morte”, e especialmente o pior de tudo de um circo: os palhaços. Se há alguma coisa que realmente detesto é palhaço. O palhaço, na sua origem de bobo da corte, era entreter os convidados da corte mostrando um caminho debochado para se fazer um retrato da sociedade. Mas não, eram sempre uns chatos que apareciam para incomodar ou assustar as criancinhas. Não à toa, no filme inspirado na obra de Stephen King – It – o palhaço aparece e começa o show de horror. Para dar impacto na sua obra, o autor utiliza algo possível na realidade, já que o palhaço chega mesmo a assustar as pessoas, não seria nada irreal um palhaço assassino. Na Bienal de Artes de São Paulo, de 1996, fora feita uma instalação onde quatro telões exibiam palhaços e ao fundo se ouvia uma gargalhada típica de filme de terror. Realmente era natural o impacto que gerou. O Bozo, palhaço mas chato do universo, era o mentor do Garoto Juca em seu desenho animado, onde sempre saia com muita inteligência das situações. Eu diria que era algo um tanto quanto “macunaímico”, o palhaço como anti-herói. O circo em sua maioria tenta mostrar o limite da capacidade humana. Nos trapézios o mínimo erro pode-se levar a morte, assim como os domadores de leões ou aqueles que brincam com os elefantes. Sempre tentando chocar o público com sua capacidade técnica de condicionamento das ações animais ou com as anomalias, vistas em filme antigos, como a mulher barbada, anões, contorcionistas e com técnicas de engolir espadas ou pirofagia.

O futebol como arte. Realmente essa é a mais difícil para mim, um fã do ludopédio, de conceituar como puro entretenimento. Para o Brasil genericamente se referem como país do futebol, do samba, do carnaval. Seria o futebol uma alma da cultura brasileira. Na década de 1950, o Brasil era praticamente irrelevante no mundo pelo seu futebol. Ganha o primeiro mundial em 1958, depois da derrota de virada para o Uruguai no Maracanã em 1950. Nada mais é do que um esporte coletivo, motivando as técnicas de estratégia e preparo físico. Não se pode falar de cultura do futebol. Livros de técnicos (não só de futebol) que transmitem ensinamentos de gerenciamento de equipes e outros fatores não é propriamente cultura. Oras, deve-se sempre lembrar que para que exista sua diversão, alguém precisa trabalhar, ou seja, o que para você é diversão pode ser trabalho para muita gente. Assim como as corridas de carro, de cavalos, de cachorros, briga de galo. È pura diversão, às vezes de extremo mau gosto, como a popular tourada espanhola. Que existe de culto em matar um touro após fazê-lo de bobo?

Quanto ao teatro, existe muita coisa interessantíssima, lógico, mas existem as peças de puro entretenimento, como por exemplo “Monólogos da Vagina”, escrita por Miguel Falabella, ou “Analista de Bagé”.

Os shows são muitíssimo interessantes. Nada contra a eles, mas neles vamos para nos emocionar. Vamos ver aquele artista que nos emociona com sua música. Vamos para rir, como num show de Jô Soares ou Tom Cavalcante. É uma tênue linha separa entretenimento e cultura. Uma analogia possível seria ir a uma livraria e lá imaginar que todos os livros têm o mesmo valor. Como se o cuidar das plantas tivesse o mesmo valor que a obra de Dostoievski. São coisas diferentes para diferentes fins.

Num centro cultural, idéia esta iniciada com o Centro Georges Pompidou em Paris, no início da década de 1970, juntou-se inúmeras formas de cultura num mesmo lugar. Uma biblioteca junto ao teatro, junto a um museu. No Parc de La Villette, juntou a cité de la music – a cidade da música – e mais um monte de outros centros de cultura num mesmo parque. Um verdadeiro complexo cultural. Antes eram somente projetados edifícios específicos como biblioteca, teatro, arena. Essa união dos vários programas num mesmo lugar gera uma nova arquitetura. Estão presentes salas de aula, atelier, restaurante e lojas, pois muitos museus sempre dispuseram de cursos e palestras.

No Brasil surge uma união inédita: esporte e cultura. Além das bibliotecas, teatros, salas de aula, os SESC´s possuem piscinas, quadras e aulas de dança, ballet, artes marciais e ginástica. Uma belíssima união. A mesma união já estava presente em parques como o Ibirapuera, porém a diferença esta na assistência, com vestiários, orientadores físicos, etc.

Porém, no Brasil, existe certa tendência de achar que centro cultural deve ter exposições de arte, fotografias, vídeos, sobre as letras, de certa forma somente focada na área das ciências humanas, esquecendo as outras áreas. O Jardim Zoológico é algo colocado com um simples jardim, ou algo para se visitar com as crianças. Não se entende como promotor da cultura. Nota-se ao se chamar uma pessoa das ciências humanas se utiliza o termo intelectual, enquanto que para as áreas biológicas o máximo que se diz é especialista. Tenta-se forjar a idéia que somente um escritor, historiador, poeta ou filosofo é um agente cultural. Eis então a grande quantidade de centros culturais “espalhados” sempre nos mesmos locais, falarei em breve sobre isso, todos eles com suas áreas de exposição, midiateca, biblioteca e loja.

Não se tem notícia de nenhum novo centro que tenha uma mínima vocação ao local onde será proposto. Adoraria ver construídos a cidade da música do Rio de Janeiro e o Museu Guggenheim, no Píer Mauá, respectivamente projetos dos arquitetos Christian de Portizamparc e Jean Nouvel. É bom refletir, como cita o arquiteto Márcio Roberto em relação à construção do Museu Guggenhein: “(...) Há pelo menos uns 20 anos, representantes de diferentes grupos internacionais aparecem freqüentemente por aqui, buscando parcerias e formas de viabilizar a construção de um grande aquário ou um complexo deles, que poderiam ser anexados a uma universidade de estudos do mar, biologia marinha etc. Enfim, um produto que ainda não existe no país (...)”. Sua reflexão vem de encontro à questão proposta por este texto - falta de centros culturais nas outras áreas da cultura. Outra questão, especificamente na cidade de São Paulo, é a localização dos novos centros culturais. Praticamente estão ou na Avenida Paulista ou no centro da cidade. No caso do centro, dando nova função aos antigos edifícios, o que é um processo de enorme complexidade cultural e de difícil compreensão do público leigo no curto prazo.
Salvar o patrimônio da cidade vai muito além de uma simples preservação histórica. A arquitetura é uma das bases antropológicas do conhecimento de uma civilização. Assim como um monumento, a arquitetura da cidade só tem sentido se preservada além do edifício, em seu conjunto. Conforme comenta o arquiteto Miguel Forte: “Arquitetura: o grande reflexo de todas as épocas.” A partir do momento que se retira uma peça de arte, como por exemplo uma escultura de uma igreja, esta escultura sozinha não representa o contexto completo. Continua sendo obra de arte, mas perde seu sentido original e com ele aquilo que poderia ser a lógica de sua essência. Entender desde a indústria cultural ate o patrimônio histórico é conjunto muito amplo de conhecimento e atinge certamente muitas áreas.

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