junho 29, 2009

Micro Ondas

Mais um micro conto.
*
Nas ondas daquela lagoa eu me arrastei. Eram enormes, maior do eu. Estava sempre ali na beira prestes a entrar, mas algo me dizia para primeiro aprender a nadar. As ondas sempre batiam nos barcos ancorados. Eram enormes os barcos ancorados. Do outro lado da ilha as ondas eram maiores ainda. As dunas de areia e a cor verde do mar eram diferentes da lagoa do centro da ilha. Tudo era tão grande. As dunas eram gigantescas, tal qual o Everest. Eu tentava me equilibrar e caia muitas vezes naquela partezinha de areia entre os barcos. Detestava. Era meio suja. Não era mole tanto quanto as areias das dunas e do mar verde, onde o vento também me derrubava. Mas lá parecia que a mulher de Zeus pousava suas mãos a me segurar; sentia-me protegido, como se aquela presença feminina estaria lá para todo o sempre.

Certa vez rolei pela duna. Eu e aquela mulher. Ela conduziu aquela pequena prancha verde, preta e amarela, com aquela imagem gravada; uma imagem masculina, porem de cabelos longos encaracolados. Era um dia de muito sol e havia em meu rosto uma pasta branca. Meus braços e minhas pernas eram roliços. Dormi outra vez envolto em seus braços, ao zumbido daqueles ventos. As lembranças são poucas desse tempo, não passando da mulher, dos barcos e do mar verde.

Hoje, vinte anos depois, já com vinte e dois anos de idade, olho para os barcos e eles são tão pequenos. As ondas hoje não passam da minha perna magra, mas continuam verdes, assim como a brisa ainda sopra com força. E nunca soube quem era aquela mulher, que parecia ter vindo de Atenas. De pele branca como as areias das dunas, era também macia e quente. Agora havia mais pranchas lá, nas mesmas dunas, que se mexem e parecem me perseguir. São verdes, pretas e amarelas, com a bela imagem gravada, que para mim não passa do primeiro a ter vida saindo de uma prancha, ainda a cantar Get up, Stand up... Stand up for your rights... Mas a mulher permanece misteriosa. Um mistério, assim como o que transformou em micro ondas aquele maremoto da minha infância. Um dia reapareça e dirá seu nome...

Um comentário:

Anônimo disse...

Que belas imagens Ludo. O início do mini-conto me lembrou de um livro que acabei de ler hoje: Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra, de Mia Couto.

Hoje enfrentei o dilema da tela em branco. Ela ganhou. Continua imaculada.

:)

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