outubro 10, 2007

Mini conto

Sob a luz do pólo petroquímico, a leveza daquela noite quente de verão deixava sua beleza numa atmosfera de graça. Sua silhueta era uma questão de limite da imaginação e da realidade, tudo ao mesmo tempo. O sorriso da minha face não saia. O caminhar naquele pequeno trecho de área pública próxima à avenida proporcionava um prazer incrível, mesmo que com ela a pior encrenca do mundo seria fácil de levar.

O problema que tudo acaba. E acabou para sempre, naquela hora em que a bomba beijou o chão. Ao sair do cinema, no meio da seção, pude ver a cidade em chamas. As chamas que queimavam e não as que ardiam. E hoje só lembro que aquele beijo, era mesmo o fim.

Mas todo fim é na verdade o começo de alguma coisa. E hoje quando passo naquela avenida penso em como tudo poderia ser diferente. Mas se eu soubesse o que sei agora, acho que erraria tudo exatamente igual.
Explicação do mini conto

Nada mais interessante do que escrever um pequeno texto sob um contexto bastante interessante, onde trago uma imagem, logo no primeiro parágrafo. Para quem já passou perto de um pólo petroquímico sabe daquela luz 24 horas por dia, meio amarela, ao longe, com aquelas cercas de alambrado ao redor, como em Paranaguá, ou mesmo em São Sebastião. Uma noite quente de verão, nada mais é que aquela sensação da noite úmida de verão litorâneo. E o passeio naqueles resíduos urbanos que são resultados da instalação destes equipamentos, como no caso o pólo petroquímico, mas poderia ser armazém, porto, aeroporto, até mesmo estação de trem. Mas o importante é que a frase “sob a luz do pólo petroquímico” é da música dos Engenheiros do Hawaii, “Pose – Anos 90” (1992):

“(...) Vamos duvidar de tudo que é certo
Vamos namorar à luz do pólo petroquímico
Voltar pra casa num navio fantasma
Vamos todo mundo, ninguém pode faltar (...)”


No segundo parágrafo começo colocando uma dúvida que tenho sobre os ciclos: Por que tudo acaba? E ai tinha que dar um rumo para acabar aquela boa sensação do verão úmido. Logo pensei em um bombardeio, uma coisa um pouco Kuwait, pensando em como pode ter sido a Guerra do Golfo, em 1991. Nada mais legal que então “roubar esses versos como quem rouba pão” (até para justificar eu roubo palavras dos Engenheiros do Hawaii, essa veio da letra de “A Conquista do Espelho” - 1992). Logo lembrei dos versos de “Cidade em Chamas” (1988):

“(...) Então, só resta uma solução
Sair no meio da sessão
Pra ver a cidade em chamas (...)”

Depois lembrar daqueles versos de Camões, onde falava do amor: “Amor é um fogo que arde sem se ver”. Mais um pouco e lembrei da música do RPM, “A Cruz e a Espada”:

“(...) E agora eu vejo aquele beijo
Era mesmo o fim
Era o começo e o meu desejo
Se perdeu de mim (...)”


Nada melhor que iniciar o terceiro e último parágrafo com a mesma música. E para finalizar colocar a frase completa da música dos Engenheiros do Hawaii, “Surfando Karmas & DNA” (2002), uma que eu não concordo muito, mas fecha o texto de forma espetacular:

“(...) ?Quantas vezes a gente sobrevive à hora da verdade?
Na falta de algo melhor nunca me faltou coragem
Se eu soubesse antes o que sei agora
Erraria tudo exatamente igual (...)”


Eu provavelmente erraria tudo diferente. Mas para fechar o texto a frase cria um efeito interessante. O mesmo efeito que a música gera. E isso que é compilar um texto cheio de pequenas informações. Lógico que muitas delas estão na cara, de qualquer um que conheça um pouco Engenheiros do Hawaii. Mas a pouca profundidade desse texto consegue colocar uma imagem, cuja parte em que falo sobre a silhueta, pensei naqueles filmes onde se usa muito essa técnica, consegue criar uma atmosfera, consegue trabalhar duas questões ainda: a perda e a reflexão, na parte onde estaria a questão de errar tudo exatamente igual. Na verdade sem olhar a minha opinião, fica parecendo pelo texto que eu concordo com essa hipótese de nada mudar se eu pudesse mudar o passado. O que eu, e creio que metade das pessoas, também acredita e até gostaria. Mas tem mais um detalhe ai. Tirei da música as partes que formam o texto. Ou seja, de uma mídia fiz outra. Na literatura não se conseguiria achar estas referencias. Assim como muitas referencias das músicas podem estar na literatura (como acontece muito). Em poucas palavras se consegue transmitir muita coisa, e isso que busco num escritor.

2 comentários:

Anônimo disse...

Bem legal, gostei do seu conto, vc está muito bem assim...vestido de escritor ! A idéia é fértil...por que o fim das coisas ? Porque existem os inícios e pra ter inícios, algo tem q acabar...pra doer o coração e a gente escrever ou cantar...por isso existem os poetas e os escritores, ou mesmo as músicas né ? Continue sempre, pois as imagens que levamos na mente tem que ser espalhadas pra mente dos outros, assim a gente não pensa sozinho rsrs. Saudações lancinantes, Adri

João Batista disse...

Pô, ao menos caindo a bomba você percebe o fim, claro e inequívoco. Difícil é quando a bomba é de gás invisível e inodoro. Acabou a festa? Opa! Não tinha percebido!

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