No começo deste ano participei do concurso de contos da Livraria Cultura. O texto básico surgiu deste conto que publico agora na integra. A versão final tinha que ter somente 2000 palavras. Este passa longe dessa marca...
Escrevi este texto pensando na Virada Cultural, e o nome veio de uma música do folclore russo, muito conhecida pelos descendentes da comunidade. Olhos Negros
Escrevi este texto pensando na Virada Cultural, e o nome veio de uma música do folclore russo, muito conhecida pelos descendentes da comunidade. Olhos Negros
Ando pela cidade na madrugada. Uma noite agitada, culturalmente agitada. Virando vinte e quatro horas, com seções de cinema, palestras, tudo acontecendo no meio da madrugada. Nada melhor para acabar com a insônia causada por aquela rotina cansativa de trabalho daquela agência de publicidade, que começa com o sol a nascer e termina quando a Livraria Cultura já está fechada.
Mas a ansiedade daquela noite era diferente de outras viradas culturais. Haveria uma película em especial que seria apresentada no Teatro Eva Herz. Como de costume, nenhum amigo estava disposto a assisti-la. Amigos; ao se tratar de programas culturais a grande maioria simplesmente evapora. Como diz uma amiga, nada melhor que a pizza após o cinema, dispensando o primeiro.
Lá estava eu sozinho, já andando por dentro condomínio projetado por Libeskind, já vendo ao fundo a entrada da livraria, quando vejo em minha direção uma pequena jovem, de pele muito branca, cabelos castanhos escuros lisos e longos e aquele par de olhos negros. Vestida com um belo vestido em forma de tubo, em tom vinho, segurava um bolsa com motivos indianos e uma pequena sacola da Livraria Cultura, contendo um exemplar de Anne Rice e algum outro livro não conseguindo identifica-lo tão rapidamente. Num piscar de olhos, muda ela de direção e vai seguindo na minha frente de volta a livraria. Nossa distancia diminuiu, e consegui identificar o segundo volume: Notas do Subterrâneo.
Seguimos praticamente lado a lado até adentrar a sala, no piso superior, sentada ela numa das ultimas fileiras e eu numa das primeiras, já que os óculos pedem a tempo uma revisão geral. Durante toda a projeção da película tive a impressão de que ela não assistia ao filme, olhando fixamente para mim. No início achei que era paranóia e tentei me controlar, mas ao meio da projeção transpirava, num sentimento ambíguo entre medo e emoção, torcendo para que terminasse logo tudo aquilo. Minha noite de prazer tornava-se um transtorno.
Ao fim da projeção olhei para o fundo, coisa que tive receio por todo o tempo, e lá estava ela, sentada, enquanto todos a sua volta estavam já em pé. Estava disfarçando, anotando algo num pequeno caderno, não conseguia ver do local em que estava. Logo se levantou e saiu da sala. Saí então pausadamente, como que preocupado com o que poderia acontecer na minha saída. A fome que sentia desapareceu, a pizza já estava noutra dimensão. Tratei de voltar logo para casa, desmarcando no caminho as outras atividades com os amigos e como que por milagre dormi rapidamente ao me deitar. No dia seguinte haveria uma reunião na agencia, sobre uma campanha de palitos de dente.
Uma noite incrível - bem dormida; acordei relativamente cedo e fui para a agência como um estagiário vai para seu primeiro emprego, nem parecia ter passado os quinze anos desde o final da faculdade e aquele sábado. Ao chegar, já estava tudo pronto para a reunião, o material sobre a mesa e a apresentação já testada e no ponto. Já sentado na mesa, os representantes do cliente e os redatores, o diretor de arte diz ter uma surpresa. Nada poderia ser mais surpreendente do que ver aqueles olhos negros entrar na sala de reuniões sendo apresentada como a nova modelo para as caixinhas de palitos. Fiquei atônito e ela exclamou numa suave voz de veludo:
- Olá, não era o senhor na Livraria Cultura ontem à noite? Te vi no momento em que eu anotava os créditos...
Mas a ansiedade daquela noite era diferente de outras viradas culturais. Haveria uma película em especial que seria apresentada no Teatro Eva Herz. Como de costume, nenhum amigo estava disposto a assisti-la. Amigos; ao se tratar de programas culturais a grande maioria simplesmente evapora. Como diz uma amiga, nada melhor que a pizza após o cinema, dispensando o primeiro.
Lá estava eu sozinho, já andando por dentro condomínio projetado por Libeskind, já vendo ao fundo a entrada da livraria, quando vejo em minha direção uma pequena jovem, de pele muito branca, cabelos castanhos escuros lisos e longos e aquele par de olhos negros. Vestida com um belo vestido em forma de tubo, em tom vinho, segurava um bolsa com motivos indianos e uma pequena sacola da Livraria Cultura, contendo um exemplar de Anne Rice e algum outro livro não conseguindo identifica-lo tão rapidamente. Num piscar de olhos, muda ela de direção e vai seguindo na minha frente de volta a livraria. Nossa distancia diminuiu, e consegui identificar o segundo volume: Notas do Subterrâneo.
Seguimos praticamente lado a lado até adentrar a sala, no piso superior, sentada ela numa das ultimas fileiras e eu numa das primeiras, já que os óculos pedem a tempo uma revisão geral. Durante toda a projeção da película tive a impressão de que ela não assistia ao filme, olhando fixamente para mim. No início achei que era paranóia e tentei me controlar, mas ao meio da projeção transpirava, num sentimento ambíguo entre medo e emoção, torcendo para que terminasse logo tudo aquilo. Minha noite de prazer tornava-se um transtorno.
Ao fim da projeção olhei para o fundo, coisa que tive receio por todo o tempo, e lá estava ela, sentada, enquanto todos a sua volta estavam já em pé. Estava disfarçando, anotando algo num pequeno caderno, não conseguia ver do local em que estava. Logo se levantou e saiu da sala. Saí então pausadamente, como que preocupado com o que poderia acontecer na minha saída. A fome que sentia desapareceu, a pizza já estava noutra dimensão. Tratei de voltar logo para casa, desmarcando no caminho as outras atividades com os amigos e como que por milagre dormi rapidamente ao me deitar. No dia seguinte haveria uma reunião na agencia, sobre uma campanha de palitos de dente.
Uma noite incrível - bem dormida; acordei relativamente cedo e fui para a agência como um estagiário vai para seu primeiro emprego, nem parecia ter passado os quinze anos desde o final da faculdade e aquele sábado. Ao chegar, já estava tudo pronto para a reunião, o material sobre a mesa e a apresentação já testada e no ponto. Já sentado na mesa, os representantes do cliente e os redatores, o diretor de arte diz ter uma surpresa. Nada poderia ser mais surpreendente do que ver aqueles olhos negros entrar na sala de reuniões sendo apresentada como a nova modelo para as caixinhas de palitos. Fiquei atônito e ela exclamou numa suave voz de veludo:
- Olá, não era o senhor na Livraria Cultura ontem à noite? Te vi no momento em que eu anotava os créditos...
Um comentário:
Gosto do conto Ludo, e das imagens que ele projeta. O narrador continua a história ou fica por nossa conta?
Quando o narrador conta que ela anota alguma coisa no papel, imaginei que ela poderia também chegar em casa e escrever sobre o ballet de olhares.
Escreva mais ficção por aqui, ou realidade mesmo. É mto bom o seu tom.
Bjo, Karina
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