setembro 20, 2007

Prisioneiro

“(...) Prisioneiro, prisioneiro, prisioneiro não
Se você me pegar eu vou chamar meu irmão
Com tanta gente roubando ninguém vai me pegar
Sigo tranqüilo no meio ninguém vai me dedar
Vivo bem com o tráfico e com a corrupção
Se o negócio sujar é só tomar um avião (...)

Duvido que um dia isso possa mudar
Tem prá todos ninguém irá tentar
Me tirar o apoio e a posição
Me colocar enfim numa prisão (...)”


Prisioneiro - Ultraje a Rigor (1987)

E depois me falam que o tal rock nacional não dizia certas verdades. Não vejo muita mudança daqueles anos em que o Brasil voltava a ser uma democracia e dava liberdade plena para que a voz, muitos anos sem poder pronunciar grandes coisas, pudesse de novo falar sobre tudo. O que acho estranho nos dias atuais é exatamente a falta de liberdade e um silêncio. Uns falam o que querem e outros não podem falar. Eu nunca falei nada que tivesse sido sumariamente censurado, mas temo um dia isso acontecer. Afinal, que existe certo patrulhamento existe, isso é inegável. O bom de ter um blog quase sem leitores é exatamente esse: eu escrevo o que quero e ninguém me irrita. Se algum desavisado ler, sem problema.

O que eu não consigo é ver um futuro nessa situação. Li um bom texto de Daniel Piza, publicado no caderno de domingo no “Estadão” (Diálogo de Macacos). Realmente mostrava duas versões sem conseguir sair do lugar. Mas, o mais interessante é o fato dos dois macacos estarem presos e nem sequer em momento algum isso entra em nenhum dos dois lados. Logo me fez lembrar da minha “velha infância” e da música do Ultraje a Rigor. Às vezes me pergunto se essa influencia desse rock nacional me “faz bem ou será que me faz mal”? Pouco importa. Eu não parei ai. É uma pequena referencia para quem foi pré-adolescente naqueles anos. Como Zeca Camargo disse no programa “Sempre um Papo”, da TV Câmara, tudo que fizemos dos treze, quatorze, aos vinte anos de idade temos a impressão de ser o melhor de tudo. Isso se deve ao espírito jovem. Essa juventude explorada politicamente, pelo menos durante a minha adolescência foi. Era um “direito” ao voto aos 16 anos de idade, um lema de que “a juventude vai mudar esse país” e outras coisas correlatas. Só vejo depois de mais de quinze anos que a política não se renovou. São os mesmos nomes e com toda a biografia alterada. O melhor mesmo é seguir o conselho de Nelson Rodrigues aos jovens: “Envelheçam!” (Essa eu tirei do almanaque da Rede Globo – Nelson Rodrigues sendo entrevistado por Otto Lara Resende, em 1977).

O problema maior é estudar a história recente do país. Um dos nomes que para mim são uma das maiores incógnitas é José Sarney. Tem bibliografia sobre ele já. Seus anos de governo foram marcados por um desarranjo enorme na economia, o que de certa forma foi importante para não errar no Plano Real. Depois de Sarney, acredito que Collor rompeu tantos outros fatores econômicos que é impossível saber o que se deve a Sarney ou a Collor. Mas é inegável a liberdade total da imprensa naqueles anos. Isso, só para recordar bem, era complicado, mas a Globo teve um de seus programas humorísticos de maior sucesso naqueles anos: TV Pirata. Era tamanha a liberdade que o programa teve inúmeros problemas. Na extinta Manchete, Agildo Barata Ribeiro tinha o “Cabaré do Barata” que era talvez um dos melhor programas políticos que consigo me lembrar. As charges atuais não chegam nem perto da produção daquele programa com os bonecos. Certo que estes bonecos me lembram um pouco aquele (boneco) “Zé do Muro” que o PT usava nas eleições de 1982 e que em 2000 a deputada Luiza Erundina fez ressurgir das cinzas. O mais interessante que meu “primeiro conto” chamava “A Traquinagem do Zé do Muro”, baseado naquele boneco. Era um misto de “Boneco Assassino” com Saci Pererê. Lógico, nem cheguei a ser cogitado como participante naquele miserável concurso de contos da biblioteca... Isso foi em 1988. Biblioteca que esta lá até hoje... O Colégio também, mesmo não tendo mais turmas de quinta a oitava séries... Coisa de Mário Covas...

Nada melhor que o tempo mesmo para ver acontecer situações que já previa. O problema não é individualmente não acreditar em algum governante ou gestão, isso até é o normal. O que parece ter se criado atualmente é uma falta de critérios para a “massa” avaliar a atividade política. Não se tem mais a diferenciação de quem era ruim ou bom. Por isso Sarney volta a ser uma incógnita. Não sei se a atual bibliografia o defende baseado no relativismo atual ou se os fatos (estes difíceis de apontar) são representativos das reais posições daqueles momentos. È difícil entender um momento atual onde Lula é o presidente, Sarney e Collor fazem parte de sua base de apoio e a oposição era aquela que ficou ao seu lado em 1989, contra Collor. Se colocar Maluf (é, ele ainda existe) nesse bolo, aí que a realidade e a fantasia se transformam em uma só coisa.

Esta perda da realidade é interessante para certos grupos políticos que podem se esconder e não ter reflexos dessas atitudes no campo eleitoral. Como Rodrigo Constantino escreve, falando sobre Lord Acton: “(...) A democracia, porém, não pode ser vista jamais como simples ditadura da maioria. Para Lord Acton, se é ruim ser oprimido pela minoria, é ainda pior ser oprimido pela maioria. Afinal, existe uma reserva latente de poder nas massas a qual, caso seja despertada, a minoria raramente consegue resistir.(...)” Agora, no longo prazo isso deve se dissolver. Sempre o partido que está no poder de certa forma aglutina em torno de si algo que não esperava. Faz parte da arte da política. Isto que estou falando acima já foi citado em inúmeros artigos de vários autores, o que estou fazendo é colocar estas questões de uma maneira a entender em que momento isso aconteceu. Só acho que, mesmo Sarney tendo deixado o governo em 1990, estes dezessete anos ainda não são suficientes para entender o que aconteceu naquele período.

Algumas questões podem ser colocadas. Sarney esteve sozinho em grande parte do tempo de seu mandato, sem partido e sem base de apoio. O que pode ser apontado pela enorme quantidade de políticos candidatos à sua sucessão, a criação do PSDB, com dissidentes do PMDB entre outros. Pode-se notar que duas figuras importantes no processo de abertura política – Ulisses Guimarães e Leonel Brizola - tiveram pouco reconhecimento por parte dos eleitores, que buscaram na novidade de Collor e Lula sua maior representatividade. O fato de Brizola ficar em terceiro lugar não prova absolutamente nada. Mario Covas ficou em quarto lugar, seguido de Paulo Maluf e Guilherme Afif Domingos. Em 1994, teve Brizola menos votos que o candidato do PRONA, Enéas Carneiro. Quanto mais se afasta o fantasma da ditadura, menos importância estas personagens têm.

O momento político mundial durante o governo Sarney era um dos melhores: Ronald Reagan, Margaret Thatcher e Michael Gorbachev. Sem crises mundiais como as do petróleo nos anos 1970 ou guerra do Iraque, por exemplo. Certo que sabemos que a onda de crescimento mundial aconteceu no final dos anos 1990 (não à toa, tudo sempre tem um reflexo anterior).

Com esse quadro, o máximo que conseguimos ver que alguns fatos comprovam que a maturidade democrática pode levar mais uns vinte anos se continuar dessa maneira. A cada pequena crise temos simplesmente a troca das decisões e uma total falta de continuidade de planos. E isso já não é novo, pois já com Juscelino Kubitschek tinha o Brasil passado por isso. Vejam só, tudo isso para dizer que a mudança de Fernando Henrique Cardoso para Lula em 2002 foi uma péssima escolha e a permanência dele em 2006 mais um retrocesso.

Depois não posso dar razão aos Engenheiros do Hawaii...

“(...) Somos quase livres
(Isto é pior do que a prisão) (...)”

Exercito de Um Homem Só II – Engenheiros do Hawaii (1990)

Nenhum comentário:

Os três textos

Já que continuo aguardando o Renzo Piano da postagem anterior – comprar a Black Friday é isso: o melhor preço, porém, não chega nunca – aca...