Certa vez fui assistir á uma aula na FAAP, junto com minha namorada da época, e a aula tratava da arquitetura de “um tal” de Albert Speer. Estuda no Mackenzie e até então não tinha tido nenhuma aula a respeito da estética e das intenções por trás da estética deste arquiteto. Na aula havia um texto base, de Luis Fernando Veríssimo, que trato de reproduzir abaixo, que, de tão hilário, foi inesquecível!
Na aula foi passado um vídeo e, passados na época quase 50 anos da 2ª Guerra, a estética era mais do que factível de ser analisada com a devida isenção do tempo. Uma aula realmente daquelas que separam os cursos em superiores e outros...
Por Luís Fernando Veríssimo: Ach Viena!
- Ach, Viena. Não é maravilhosa?
- Você é maravilhosa.
- Não beije meu pescoço aqui. Coma a sua torta.
- Prefiro seu pescoço.
- Nein! Tome seu chocolate. Olhe, uma valsa! Vamos dançar? Traga a torta.
- Valsa, valsa, valsa! Não tocam outra coisa nesta maldita cidade?
- Mas esta é a terra de Strauss.
- Prefiro Wagner.
- E não é só Strauss. Esta é a terra de Mahler. E de Schönberg.
- Quem?
- Schönberg. Ele está fazendo experiências maravilhosas com a música.
- Pra você tudo é maravilhoso.
- Viena é maravilhosa!
- Seu pescoço é maravilhoso.
- Pare! Estão nos olhando.
- Também, não sei por que você insiste em vir para estes cafés de calçada. Estão sempre cheios.
- Toda Viena vem aqui. Olhe. Lá está Karl Kraus!
- Quem?
- Vai dizer que você não conhece Karl Kraus?
- Aposto que ele também é maravilhoso.
- Ele é mais do que maravilhoso... Ele é... Ele é... o espírito de Viena em pessoa!
- Sei.
- Coma a sua torta.
- Estou cheio de torta. Vamos para o meu quarto.
- Já disse que não. E largue o meu joelho.
- Eu sei. Você acha que ele é melhor do que eu. Você...
- Olhe quem está passando. É Loos! Loos, o arquiteto!
- Hruok.
- Que foi isso?
- Um arroto.
- Assim é demais! Aqui estamos nós, numa tarde de verão, sentindo o perfume das vinhas do Wienerwald, no centro da cidade mais maravilhosa do mundo, a cidade de Musil, de Hofmannsthal, de Schnitzler, de Wittgenstein, de Klimt... e você arrota!
- O cheiro que eu sinto é o da decomposição do império.
- Que bobagem. O que está acontecendo em Viena é uma revolução no espírito humano. Nós vamos mudar a Europa. Nós, em Viena! Estamos no limiar de uma era como nunca houve igual. De paz, de prosperidade, de criatividade, de alegria de viver. Uma era... maravilhosa! E você quer ir para o seu quarto imundo.
- Está bem. Esquece.
- É essa sua atitude. Você precisa mudar.
- Está bem, está bem.
- Você fez o que eu pedi? Fez?
- Não.
- Está vendo só? Você diz que faria qualquer coisa por mim. Mas eu pedi para você ir ver o doutor Freud, para o seu próprio bem, e você não foi.
- Cheguei a ir até a porta, mas não entrei. Sei lá.
- Ele está fazendo coisas milagrosas. Vem gente de toda a Europa consultá-lo. Foi uma dificuldade arranjar uma hora. Ele mudaria você. E você não foi. Depois ainda diz que me ama.
- Está bem. Se você marcar outra hora, eu vou. Juro. Eu...
- Ouça! É o Danúbio Azul! Não, esta nós temos que dançar. Se você não dançar comigo, eu danço com Kokoschka.
- Com quem?!
- O Kokoschka. Um estudante de arte que conheço. Está sentado ali.
- Então vá dançar com o Kokoschka.
- Você ficou magoado?
- Vá dançar com o Kokoschka, já disse! Ele deve ser maravilhoso. E eu sou um pintorzinho de nada.
- Adolf...
- Vai. Vai. Mas um dia você vai se arrepender. Você ainda vai ouvir falar de mim! Vocês todos ainda vão ouvir falar de mim!
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